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segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

METAPOEMA: CONFISSÃO E DESTEMPERO

Acabo de ler um poema chamado "Confissão"  da poetiza angolana Alda Lara. A leitura  acabou  inspirando esse meu "Destempero". É interessante quando um poema é fruto de um outro. É uma espécie de metapoema (1) em que o poema não fala de si mesmo, mas que nasce inspirado por outro. Espero que o amigo goste dos dois. O Confissão está no blog "Angola: Os Poetas" onde é possível encontrar texto de diversos autores  angolanos. Vale conferir o blog.


DESTEMPERO 
Um poema cru
 poema sem tempero
 poema cruel
reflexo da vida
vida crua
destemperada
vida cruel
cruel como o poema
sem tempero consumido
de vidas consumidas.
Rio, 28/02/11 (23h e 48)


Confissão
no silêncio pesado do caminho,
ouviu-se um passo, cadenciado

na firmeza das horas decisivas.

a sentinela bradou:
- quem vem lá?...

o homem podia ter respondido
qualquer coisa parecida
com: “gente de paz”…

mas não. onde a paz,
se no seu peito ardiam agonias

enraivadas,
se nos seus olhos boiavam

visões de fogo e de morte,
e as suas mãos,

(ó belas, generosas mãos!)
vinham ainda tintas

do sangue dos camaradas?...

não trocou portanto as falas.

Respondeu simplesmente, sombriamente:
- eu

E a sentinela, varou-o com três balas.

     (Alda Lara)




(1) O dicionário (Aurélio) nos diz que metapoema é o "uso, pelo autor, do próprio poema para assinalar a sua crítica ou sua atuação ao criá-lo". Este conceito, portanto, não equivale ao usado aqui por mim. Poderia ter usado o conceito de "intertextualidade", mas prefiro manter o metapoema. Creio que ele se aproxima do termo metalinguagem,, ou seja, " a linguagem utilizada para descrever outra linguagem(...)" , metapoema não poderia ser um poema para se referir a outro poema? Espero que algum especialista em linguametalinguística possa me salvar.







sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

UM POEMA, DUAS VERSÕES

No Céu Com Diamantes
"Picture yourself on a train in a station/ With plasticine porters with looking glass ties/
Suddenly someone is there at the turnstile/     The girl with kaleidoscope eyes/
Lucy in the sky with diamonds" (Imagine você mesmo em um trem numa estação/
Com porteiros de massa-de-modelar com gravatas de espelho/
De repente alguém está lá na catraca/A garota com olhos de caleidoscópio/
Lucy no céu com diamantes)    Lennon / McCartney

Ainda o trago guardado em mim
Como diamante, ainda brilha assim
Pedaço eterno de estrela
Momento infinito aqui de tê-la.
Olhar de espanto que a tudo estranha
Olhar de encanto que me acompanha
Ainda guardo o par de olhos na lembrança
Olhos negros que a memória alcança
Olhos de minha história e dela criança
Que surgindo também me fez
Criador depois de rés
Ainda trago faz década e meia
O olhar que dentro aqui ainda semeia
O olhar que me faz ser quem sou
Que, estando fora, dentro me olhou.
         Rio, 25/02/2011 (01h 30m)


Pela luz dos olhos teus
 "Quando a luz dos olhos meus/E a luz dos olhos teus/Resolvem se encontrar/
  Ai, que bom que isso é, meu Deus/Que frio que me dá/O encontro desse olhar
                  (Vínícius de Moraes )
Ainda trago em mim
Aquele olhar de espanto
Aquele olhar de encanto.

Olhos negros
Ainda os trago em mim
Como lembrança primeira
Daquele encontro esperado.

Pedacinhos de diamantes
Cravados no rosto, focados em mim
Eu que já a amava
Antes que estivesse pronta.

Meu olhar cruzou com o dela
Ela que nada reconheceu
Mas que penetrou em mim
E ficou, (e)ternamente em meu ser.
             Rio, 25/02/2011







Para Lucy, Macaíba, Lilica, Lívia, Maíra e outras versões que hoje, as 12 horas, completará uma década e meia.

         

terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

O Pequeno Príncipe e a Poesia ( Do amor e da Amizade)

O amigo ou a amiga já leu O Pequeno Príncipe? É bem provável que sim. Talvez, como eu, tenha gostado. Quem sabe o considerou um livro infantil, daqueles que a gente compra para oferecer às crianças ou o achou um livro interessante para se ler em qualquer época de nossas vidas. Como é um livro curto, talvez já o tenha lido mais de uma vez e, como aconteceu comigo, perecebeu que deixou de lado uma porção de possibilidades de leituras da obra. Há a possibilidade da leitura se concentrar nas relações afetivas que perpassam a história (o amor pela rosa, a amizade pela raposa, a saudade que narrador demonstrou ter do princepezinho e este da sua rosa...), no drama existencial e psicológico de um narrador que reencontra no deserto (na solidão) o seu eu infantil, nas relações sociais que cada planeta (micro mundos) representa.

Por vício de profissão, sempre privilegiei a leitura das críticas sociais que o texto apresenta: o planeta das relações de poder, onde um rei mais do que absolutista -um rei universal- precisa descobrir que as ordens tem que ser razoáveis e a desobediência civil de um Pequeno Príncipe que abandona o rei; a critica a uma ciência que , em sua frieza, não responde às necessidades; a alienação imposta aos trabalhadores (o acendedor de lampiões) e aceita por eles; a alienação do capitalista (colecionador de estrelas) que junta, acumula mas nem sabe bem para quê; a alienação dos que fogem da realidade para as drogas (o bêbado) e que nem sabe o porque precisa se alienar (esquecer); e segue por aí as possibilidades de reflexões sobre a nossa realidade.

Por vício de poesia, além das leituras sociais que faço do texto de Antoine de Saint-Exepéry, gosto muito também de me concentrar nas partes em que o princepezinho nos fala de suas relações com a sua rosa (orgulhosa, brigona, vaidosa...) e com a amiga raposa. É esta última que o faz refletir sobre a diferença entre o comum e o individual dentro de uma totalidade. O que torna alguém especial entre todos os outros é o que sentimos por esse alguém. É o amor e a amizade (palavra hoje tão vulgarizada que parece perder o sentido especial de sua raiz: "am" de amor , de amigo) que tornam o outro um ser especial. São estas relações -de amor e de amizade- que recriam em nós o outro da relação. O outro em si é apenas um entre milhares, em si ele é quase nada. Quantos passam por nós todos os dias e nada nos dizem, e nada são. É nestas relações já citadas que uma pessoa deixa de ser nada ou pedaço de um todo e se torna  única. Nestas relações, esta pessoa única passa a refletir em nós o seu ser: se ela sofre, também sofremos, se ela é feliz nos sentimos melhor. Essa pessoa única se reflete em nós. É justamente assim que alguns místicos compreendem a frase "somos semelhantes a deus  porque deus é amor", pois é só nesta relação que (re)criamos o outro. (Re)criamos, é claro, em nós. Este (re)criar é fruto da relação de amor/amizade. O outro em si, tão comum, tão igual a todos os outros, é (re)criado pela relação. Dizem os místicos que criar do nada é um ato de deus, de forma semelhante, nós recriamos o outro em nós quando o amamos. O outro que nos era quase nada, para nós passa a ser.

Segue a baixo duas poesias inspiradas na relação de amor e nas leituras do velho "O Pequeno Príncipe".  Espero que o amigo goste.


Entre Todos
"- Se alguém ama uma flor da qual só existe um exemplar em milhões e milhões de estrelas,
 isso basta para que seja feliz quando a contempla(...)."
O Pequeno Príncipe, Antoine de Saint-Exupéry


Sim, somos todos iguais
Não há diferenças entre eu o  mundo todo.
Somos apenas rosas entre todas as rosas do jardim
Sou mais um na multidão
Somos gado mugindo na boiada
Sou uma folha do arvoredo
Uma estrela entre bilhões
Sim, somos todos iguais
Menos quando somos amados
Para aqueles que nos amam.
Para seus olhos minhas cores são especiais
Sou só eu no mundo
A única rosa do roseiral
A pétala guardada entre páginas do livro mais querido
A estrela entre as estrelas.
Sim, não somos todos iguais
Somos um só no mundo.


Rio, 10/11/2010  (JWCL)




No Deserto
"- Tu sabes... minha flor... eu sou responsável por ela! Ela é tão frágil! Tão ingênua! Tem
quatro espinhos de nada para defendê-la do mundo..."
O Pequeno Príncipe, Antoine de Saint-Exepéry

Caminhava eu pelo deserto
Ia buscando o céu.
Nele uma estrela solitária me olhava.
Seu olhar triste penetrava todos os meus poros.
Meu olhar triste, disfarçava a dor sentida
O sorriso que o rosto forçava.
Da estrela do deserto em que estava
Percebi que o princepezinho
Ainda era, embora seis ou sete anos mais velho,
Belo, sensível e doce como aquela água límpida do poço.
Fugi do deserto em uma "besta" qualquer.
Da vidraça, o olhar triste do princepezinho
(Agora disfarçado de índia uniformizada)
fazia-me orvalhar.


Hoje carrego comigo não só meu corpo.
Trago também o deserto
E nele a imagem do princepezinho que chora
E que, disfarçada de índia, também força o sorriso.
Os sorrisos nada mudam das saudades que sentimos.
E os carneiros podem estar soltos
Corre risco a flor única.

 Rio, 03/03/2000 (JWCL)










segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Escola, Disciplina e Democracia



Em fevereiro tem inicia mais um ano letivo das escolas da rede municipal da prefeitura do Rio de Janeiro. Um mar branco e azul de crianças se espalhará pela cidade. Suas vidas no futuro será extremamente marcada   pelos anos em que elas passarão pelas escolas. O vídeo do Pink Floid fala de uma realidade que muito marcou as gerações passadas. O autoritarismo era a principal característica das escolas. Ainda mais nas escolas de países que viveram anos de ditaduras ou que possuíam a visão religiosa e/ou cívica de que o sacrifício era mais importante do que o bem estar e a própria felicidade das crianças. Sorte  dos meninos e meninas atuais que não passam suas infâncias em escolas do mesmo tipo.

     Mas nem tudo são flores para a nossa juventude atual. Além da baixa qualidade do ensino que a sociedade lhe oferece, é dado aos jovens um falso poder que os faz se sentirem donos da escola/ do mundo e os transforma, às vezes, em aprendizes de ditadores egocêntricos. E, na maioria das vezes, com o aval dos país, dos diretores, das secretarias de educação, dos psicopedagogos e de juízes da infância. Estes ajudam a transformar O Estatuto da Criança e do Adolescente em um livreto de direitos sem deveres. E assim, professores tornam-se reféns de seus alunos. Muitos fogem da profissão escolhida e conquistada, outros lutam bravamente crendo na utopia de que podem fazer a diferença. Estes últimos, em sua grande maioria, acabam passando por constrangimentos e alguns até adoecem por isso. Se vivessem no Brasil atual, os membros da banda de rock Pink Floid fariam um vídeo onde as vítimas amedrontadas seriam os professores. Até porque estão acuados e perdidos no emaranhado de leis e de orientações pedagógicas confusas e contraditórias.

     A luta pela democracia no decorrer dos anos 80 influenciou positivamente as escolas públicas. No Rio de Janeiro, por exemplo, a cidade de Angra dos Reis melhorou a qualidade do ensino e obteve bons índices de aprovação de seus alunos sem criar as tais aprovações automáticas. Os principais fatores para que isto ocorresse foram o aumento salarial que atraiu, em seus concursos, profissionais altamente qualificados  e o processo de democratização das escolas implantado principalmente no início dos anos 90, mas que hoje já se desmanchou no ar, fruto da nossa democratização conservadora e da plutocracia que ganha corpo e cada vez engorda mais.

     Aqui na cidade do Rio de Janeiro, a luta dos profissionais da educação obteve vitórias no início dos anos 80, mas logo em seguida os mesmos profissionais sofreram derrotas impostas pela gerências dos senhores Marcelo Alencar, César Maia, Conde e, atualmente, do sr. Eduardo Paes. O mesmo se deu no Estado nas gerências de Moreira Franco, Marcelo Alencar, Garotinho-Rosinha Benedita e, agora, de Sérgio Cabral. Junto com a derrota econômica (salarial) imposta aos professores por esses governantes, vieram as derrotas democráticas e pedagógicas. Os atuais diretores, por exemplo, já não se dizem representantes das comunidades (pais, alunos, professores e demais funcionários) que os elegem- e quando há eleições. Ou melhor, que são apenas consultas, visto que hoje se alega que não há eleições de diretores e, sim, consulta à comunidade. A parte principal do discurso dos diretores de escola atualmente é que eles exercem um cargo de confiança dos prefeitos. Por isso mesmo, passam a implantar nas escolas do prefeito (sic) -e não da sociedade- aquilo que ninguém acredita e que ninguém sabe a quem de fato interessa. Pergunte aos professores, pais e alunos quem elabora as tais provas da prefeitura do Rio de Janeiro? Eles concordam com a implementação? Concordam com os seus conteúdos? Quem elabora o programa das disciplinas que chegam prontos e cheios de erros  nas escolas? E quanto pagamos para que se elabore e se imprima as tais apostilas? Qual é a gráfica que tanto ganha e não imprime seu nome e endereço no que faz? Por que se esconde?  Quem acha correto que nas chamadas Escolas do Amanhã se privilegie um  material de um tal projeto chamado de Cientistas do Amanhã? Nem a professora de Ciências que conheci concordava, mas tinha que implantar. Que empresa(s) fornece(m) este material? Quanto lucra(m)? Por que não privilegiar a língua portuguesa, a arte, o esporte e a Educação física? Qual foi o critério para a escolha desta prioridade? Que equipe genial de pedagogos elabora projetos sem consultar as comunidades e os os profissionais que trabalharão com tais projetos? A SME do Rio de Janeiro começa a ser conhecida no interior das escolas como uma secretaria projetista: tudo vira projeto e bem caros.

     As perguntas acima podem não ser tão relevantes para quem não viu a melhora de qualidade que teve a Escola Pública em um período recente onde a democracia no espaço escolar ganhava força. Hoje, este arremedo de democracia existente no país e nas escolas só fazem cair a qualidade de nossa Educação Pública. Imagine você, crianças que no sexto ano de escolaridade não sabem sequer ler palavras simples ("bala", por exemplo). Que chegam no Ensino Médio e, como presenciei em muitos casos, são analfabetos funcionais. Lembro agora de um aluno do terceiro ano do Ensino Médio que escreveu no meio de linhas cheias de erros um "popgtario" tentando escrever "proprietário". Ele não teve, e acho que você concorda, nem ensino elementar (que ia até a antiga quarta série), quanto mais o básico (o antigo segundo grau).

     É um crime o que fizemos (nós da sociedade) com esses jovens. Tiramos deles o direito constitucional à Educação. E, tendo "terminado" o tal Ensino Médio, eles só podem voltar a estudar se mentirem dizendo que nunca estudaram. Mas estudaram durante 12 anos ou mais, porém não aprenderam quase nada. O pior de tudo é que isto tornou-se corriqueiro nas cidades do Rio de Janeiro e de São Paulo. As secretarias municipais e estaduais de educação coagem os professores a aprovarem (empurrarem para frente) alunos que os mesmos em suas responsabilidade pedagógicas preferiam manter no mesmo nível escolar. As SMEs e SEEs trocaram o "E" de Educação pelo de empurração. Empurra para frente com a barriga que fica bonita nas estatísticas. Mas a vida não é estática e a ignorância tem seus reflexos nos temas das eleições e nas audiências dos BBBs da Globo. A verba da educação é usada para enriquecer empresas (editoras , empresas de transporte...) e, conforme sempre digo, para fazer da nossa sociedade um grande ABC/SA, ou seja, uma Associação Brasileira de Criadores de Semi-Analfabetos.

Durkheim, Foucault, Althusser tinham posições diferentes em relação ao mundo e à Sociologia, mas concordariam que a Escola é uma instituição que serve para impor as regras sociais, impor disciplina e permitir uma certa reprodução das relações sociais. resumindo: a escola serve, entre outras coisas, para a dominação social. Antes, como nos mostra o vídeo da banda de rock, o principal era a disciplina e conteúdos abstratos sem relação direta com a vida. Tivemos um pequeno período democrático em que currículos e disciplina eram, aos pouco, retrabalhados para se pensar as questões de nossa sociedade. Agora temos a indisciplina festejada e uma escola que pouco ensina e, principalmente, quase nada ensina de democracia e cidadania.

A ignorância hoje (e sempre !) permite a dominação e a exploração da grande maioria.  A nossa ditadura empresarial-militar teve que usar muito da força bruta para coagir os jovens estudantes de sua época. A lição que tiraram para manter a dominação foi "ensinar a ignorância" nas escolas (inclusive nas privadas). Só assim, a democracia não se torna uma arma do povo, mas uma arma contra o próprio povo. Diz a nossa presidente que a educação de qualidade será a prioridade de seu governo. Alguém acredita? Eu, não. 

Para Amanda, Assis e Talita, jovens professores de História em um período histórico de retrocesso  da educação popular. Para Alessandra, que realmente alfabetiza neste período impregnado de ABC/SA (Associação Brasileira de Criadores de Semi-Analfabetos). 

PS: Este texto foi escrito no início de 2011. Até agora a prioridade da educação só ficou no discurso. Alguma surpresa? 

(Jorge Willian)

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

SOLIDÃO (PARTE 3)

O POEMA ILHADO ENTRE DUAS SOLIDÕES

Toda solidão pode ser regada a vinho, cachaça, cerveja,  lágrimas e qualquer outro líquido que entorpeça a alma. Prefiro algo mais etéreo, prefiro as canções. Elas tem a facilidade de entorpecer a minha existência, por mais realistas que sejam as suas letras. É doce a presença da música, principalmente, nos momentos em que busco ou me jogam na solidão. Cito, para homenagear, no poema Ilhado (postado aqui em Dezembro) dois músicos brasileiros que muito contribuíram para que as minhas solidões fossem regadas com doçura (arte). Paulinho da Viola e Alceu Valença tornam doce este sentimento que afeta(ou) a qualquer ser humano. Sentimento de isolar-se ou de estar isolado. Sentimento de a nada pertencer, de com nada se identificar. Sentimento de, estando, em nada estar. Sentimento também necessário para se autoconhecer. De se encontrar onde sempre se esteve. Sentimento de não se relacionar até que se perceba que só somos relações. Sentimento que fere e fortalece alguns, mas que a outros devora. Sentimento que uns buscam morbidamente e que a outros amedronta. Uns buscam, outros tentam fugir. Só ou acompanhado, a solidão nos torna ilhado em nosso micromundo.
 Espero que as canções que exponho aqui adoce as nossas próximas solidões. Alceu regravou sua própria canção "Solidão" (veja a letra na postagem anterior) e a fez ficar ainda mais triste. De outra forma, com a sua viola e na voz suave de Marisa Monte, o mestre Paulinho nos diz que todos dançamos  "A dança da solidão". O poema "Ilhado" foi criado em um desses momentos em que a solidão é a companheira possível e indesejada. Momento em que se quer a presença das pessoas do nosso mundo pessoal e que se quer estar em outro espaço geográfico, aquele espaço ao qual pertencemos e que, por topofilia, nos pertence também.

  
   Após Solidão é possível ouvir outras canções do mastre Alceu,  de
     Geraldo Azevedo, de Elba Ramalho... é só ir clicando para ouvir

Ilhado
Estou ilhado
Longe de você
Dos seus olhos, boca, ouvidos
Estou ilhado
Longe dos meus
Nenhum amigo perto                                         
Estou ilhado
Longe da minha estante
Nas mãos o Gramsci
Mas ainda mais distante
Estou ilhado
Longe dos discos meus
Paulinho da Viola e Alceu na mente
Solidão, a dança de todos
Estou ilhado
Absolutamente como Deus
Longe até de mim...sozinho estou
 ( JWCL   Angra dos Reis, 25/02/93)
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quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

SOLIDÃO (PARTE 2)

A SOLIDÃO E A  MÚSICA POPULAR

Se o amigo, por curiosidade ou outro motivo qualquer, pesquisar o verbete "Solidão"  no letras.mus.br  ou em outro sítio semelhante, perceberá que a nossa música popular tem na solidão uma das maiores fontes de inspiração. Verá também que a "musa" inspiradora é tratada de diversas formas e acompanhada de outras "musas": saudade, tristeza, resignação, dor de corno, escapismo... Segue alguns trechos de onze canções que retratam um pouco o tema. Apenas a primeira, "Estrela, Estrela", é acompanhada de um vídeo  e está na voz do seu compositor- o gaúcho Vitor Ramil- que, apesar da qualidade de sua obra , é desconhecido do grande público. "Estrela , Estrela" é de fato uma canção de ninar gente grande e faz uma reflexão muito interessante sobre a solidão. É o estar sozinho e em paz, como comentou a amiga Gabriela na postagem anterior. Originalmente, a música de Vitor Ramil   foi lançada  pela baiana Gal Costa que lhe deu uma bela interpretação. No sítio "letras.mus.br" é possível encontrar, na íntegra, as canções citadas abaixo. Outro sítio com letras é o "Vagalume". Espero que o amigo goste do vídeo e que, se possível, colabore nos fazendo lembrar de uma outra canção sobre o o tema. na próxima postagem -Solidão (parte 3)- pretendo, além de republicar o poema Ilhado, expor uma breve reflexão sobre  a "amiga das horas/ prima-irmã do tempo", a Solidão.



Estrela, Estrela
Vitor Ramil
Estrela, estrela
Como ser assim
Tão só, tão só
E nunca sofrer 

Brilhar, brilhar
Quase sem querer
Deixar, deixar
Ser o que se é

No corpo nu
Da constelação
Estás, estás
Sobre uma das mãos

E vais e vens
Como um lampião
Ao vento frio
De um lugar qualquer

É bom saber
Que és parte de mim
Assim como és
Parte das manhãs

Melhor, melhor
É poder gozar
Da paz, da paz
Que trazes aqui

Eu canto, eu canto
Por poder te ver
No céu, no céu
Como um balão

Eu canto e sei
Que também me vês
Aqui, aqui
Com essa canção
      *****

Sempre Não é Todo Dia
Oswaldo Montenegro / Mongol
Eu hoje acordei tão só
Mais só do que eu merecia
Eu acho que será pra sempre
Mas sempre não é todo dia
     ****

Dança da Solidão
Paulinho da Viola
 

Solidão é lava
Que cobre tudo
Amargura em minha boca
Sorri seus dentes de chumbo...


Solidão, palavra
Cavada no coração
Resignado e mudo
No compasso da desilusão...
Desilusão, desilusão
Danço eu, dança você
Na dança da solidão...(2x)

    ****

Tanta Solidão
Victor Chaves / Leo Chave

 
Veja no céu
Hoje a lua não saiu
Sem você
Nem o meu olhar se abriu
Pra não ver tanta solidão
    ****

Solidão
(Alceu Valença)


A solidão é fera, a solidão devora.
É amiga das horas prima-irmã do tempo,
E faz nossos relógios caminharem lentos,
Causando um descompasso no meu coração.

A solidão é fera,
É amiga das horas,
É prima-irmã do tempo,
E faz nossos relógios caminharem lentos
Causando um descompasso no meu coração.

A solidão dos astros;
A solidão da lua;
A solidão da noite;
A slidão da rua.

    ****

Solidão Que Nada
( Cazuza / Nilo Roméro / George Israel )
Cada aeroporto
É um nome num papel
Um novo rosto
Atrás do mesmo véu

Alguém me espera
E adivinha no céu
Que meu novo nome é
Um estranho que me quer

E eu quero tudo
No próximo hotel
Por mar, por terra
Ou via Embratel

Ela é um satélite
E só quer me amar
Mas não há promessas, não
É só um novo lugar

Viver é bom
Nas curvas da estrada
Solidão, que nada
Viver é bom
Partida e chegada
Solidão que nada.
    ****

SOS Solidão
(Lulu Santos)

Se existe alguém na linha
Se tem alguém no ar
Por favor, responda agora
Não me faça esperar
Há uma certa urgência
Alô, informação
Aqui sou eu sozinho
Do outro lado, não sei não sei
Instalei uma antena
E lancei um sinal
Nada no radar
Procuro no dial
Aviso aos navegantes
Tem mais alguém aí?
Só ouço o som da minha própria voz
A repetir
SOS solidão...
    ****

Porto Solidão
( Zeca BahiaGincko)

Meu coração
A calma de um mar
Que guarda tamanhos segredos
Diversos naufragados
E sem tempo...

Rimas, de ventos e velas
Vida que vem e que vai
A solidão que fica e entra
Me arremessando
Contra o cais...
    ****

Doce Solidão
(Marcelo Camelo)

Posso estar só
Mas, sou de todo mundo
Por eu ser só um
Ah, nem! Ah, não! Ah, nem dá!
Solidão, foge que eu te encontro
Que eu já tenho asa
Isso lá é bom, doce solidão?
     ****

Solidão
(Tom Zé)

Se ela nascesse rainha
Se o mundo pudesse aguentar
Os pobres ela pisaria
E os ricos iria humilhar
Milhares de guerras faria
Pra se deleitar
Por isso eu prefiro cantar sozinho


Solidão, que poeira leve
Solidão, olha a casa é sua
O telefone chamou, foi engano
Solidão, que poeira leve
Solidão, olha a casa é sua
E no meu descompasso passo o riso dela
Solidão.
    ****

Solidão De Amigos
 (Jessé)  
Lenha na fogueira, lua na lagoa
Vento na poeira, vai rolando à toa
A cantiga espera quem lhe dê ouvidos
A viola entoa, solidão de amigos

A saudade lembra de lembranças tantas
Que por si navegam nessas águas mansas
A saudade lembra de lembranças tantas
Que por si navegam nessas águas mansas

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

SOLIDÃO (PARTE 1)

VAZIO E SOLIDÃO













P.S.:          Antes do próximo texto duas perguntas:  O que é a solidão? Existe solidões ou toda solidão é uma só?


terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

CENSURA e CÁLICE

   CENSURA
"Como é difícil acordar calado/ Se na calada da noite eu me dano/
 Quero lançar um grito desumano/ Que é uma maneira de ser escutado"
         (Buarque e Gil)

Se tu falas, escuto
Se te calas, engole
Se falo, escute
Se escutas, pense
Se me calo, engulo

Se penso, falo
Se me calo engulo
Se engulo, penso
Se penso , penso
Se falo, penso
Se calo, penso
       JWCL,   Rio, 24/01/11

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O poema censura  é apenas um rascunho que quero compartilhar com o amigo leitor. Um bom motivo para expor este esboço apressado de poema é   um vídeo com uma das mais belas canções sobre o tema. Já bastava a voz do Milton, mas a canção de Chico Buarque e Gilberto Gil é um primor que vale lembrar.


          Cálice
(Chico Buarque e Gilberto Gil)

Pai! Afasta de mim esse cálice
Pai! Afasta de mim esse cálice
Pai! Afasta de mim esse cálice
De vinho tinto de sangue...(2x)

Como beber dessa bebida amarga
Tragar a dor engolir a labuta
Mesmo calada a boca resta o peito
Silêncio na cidade não se escuta

De que me vale ser filho da santa
Melhor seria ser filho da outra
Outra realidade menos morta
Tanta mentira, tanta força bruta...

Pai, Afasta ...

Como é difícil acordar calado
Se na calada da noite eu me dano
Quero lançar um grito desumano
Que é uma maneira  de ser escutado

Esse silêncio todo me atordoa
Atordoado eu permaneço atento
Na arquibancada prá a qualquer momento
Ver emergir o monstro da lagoa...

Pai, afasta...

De muito gorda a porca já não anda
De muito usada a faca já não corta
Como é difícil, Pai, abrir a porta
Essa palavra presa na garganta

Esse pileque homérico no mundo
De que adianta ter boa vontade
Mesmo calado o peito resta a cuca
Dos bêbados do centro da cidade...

Pai! Afasta ...

Talvez o mundo não seja pequeno
Nem seja a vida um fato consumado
Quero inventar o meu próprio pecado
Quero morrer do meu próprio veneno

Quero perder de vez tua cabeça
Minha cabeça perder teu juízo
Quero cheirar fumaça de óleo diesel
Me embriagar até que alguém me esqueça