Amigos e/ou Leitores

terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

O Pequeno Príncipe e a Poesia ( Do amor e da Amizade)

O amigo ou a amiga já leu O Pequeno Príncipe? É bem provável que sim. Talvez, como eu, tenha gostado. Quem sabe o considerou um livro infantil, daqueles que a gente compra para oferecer às crianças ou o achou um livro interessante para se ler em qualquer época de nossas vidas. Como é um livro curto, talvez já o tenha lido mais de uma vez e, como aconteceu comigo, perecebeu que deixou de lado uma porção de possibilidades de leituras da obra. Há a possibilidade da leitura se concentrar nas relações afetivas que perpassam a história (o amor pela rosa, a amizade pela raposa, a saudade que narrador demonstrou ter do princepezinho e este da sua rosa...), no drama existencial e psicológico de um narrador que reencontra no deserto (na solidão) o seu eu infantil, nas relações sociais que cada planeta (micro mundos) representa.

Por vício de profissão, sempre privilegiei a leitura das críticas sociais que o texto apresenta: o planeta das relações de poder, onde um rei mais do que absolutista -um rei universal- precisa descobrir que as ordens tem que ser razoáveis e a desobediência civil de um Pequeno Príncipe que abandona o rei; a critica a uma ciência que , em sua frieza, não responde às necessidades; a alienação imposta aos trabalhadores (o acendedor de lampiões) e aceita por eles; a alienação do capitalista (colecionador de estrelas) que junta, acumula mas nem sabe bem para quê; a alienação dos que fogem da realidade para as drogas (o bêbado) e que nem sabe o porque precisa se alienar (esquecer); e segue por aí as possibilidades de reflexões sobre a nossa realidade.

Por vício de poesia, além das leituras sociais que faço do texto de Antoine de Saint-Exepéry, gosto muito também de me concentrar nas partes em que o princepezinho nos fala de suas relações com a sua rosa (orgulhosa, brigona, vaidosa...) e com a amiga raposa. É esta última que o faz refletir sobre a diferença entre o comum e o individual dentro de uma totalidade. O que torna alguém especial entre todos os outros é o que sentimos por esse alguém. É o amor e a amizade (palavra hoje tão vulgarizada que parece perder o sentido especial de sua raiz: "am" de amor , de amigo) que tornam o outro um ser especial. São estas relações -de amor e de amizade- que recriam em nós o outro da relação. O outro em si é apenas um entre milhares, em si ele é quase nada. Quantos passam por nós todos os dias e nada nos dizem, e nada são. É nestas relações já citadas que uma pessoa deixa de ser nada ou pedaço de um todo e se torna  única. Nestas relações, esta pessoa única passa a refletir em nós o seu ser: se ela sofre, também sofremos, se ela é feliz nos sentimos melhor. Essa pessoa única se reflete em nós. É justamente assim que alguns místicos compreendem a frase "somos semelhantes a deus  porque deus é amor", pois é só nesta relação que (re)criamos o outro. (Re)criamos, é claro, em nós. Este (re)criar é fruto da relação de amor/amizade. O outro em si, tão comum, tão igual a todos os outros, é (re)criado pela relação. Dizem os místicos que criar do nada é um ato de deus, de forma semelhante, nós recriamos o outro em nós quando o amamos. O outro que nos era quase nada, para nós passa a ser.

Segue a baixo duas poesias inspiradas na relação de amor e nas leituras do velho "O Pequeno Príncipe".  Espero que o amigo goste.


Entre Todos
"- Se alguém ama uma flor da qual só existe um exemplar em milhões e milhões de estrelas,
 isso basta para que seja feliz quando a contempla(...)."
O Pequeno Príncipe, Antoine de Saint-Exupéry


Sim, somos todos iguais
Não há diferenças entre eu o  mundo todo.
Somos apenas rosas entre todas as rosas do jardim
Sou mais um na multidão
Somos gado mugindo na boiada
Sou uma folha do arvoredo
Uma estrela entre bilhões
Sim, somos todos iguais
Menos quando somos amados
Para aqueles que nos amam.
Para seus olhos minhas cores são especiais
Sou só eu no mundo
A única rosa do roseiral
A pétala guardada entre páginas do livro mais querido
A estrela entre as estrelas.
Sim, não somos todos iguais
Somos um só no mundo.


Rio, 10/11/2010  (JWCL)




No Deserto
"- Tu sabes... minha flor... eu sou responsável por ela! Ela é tão frágil! Tão ingênua! Tem
quatro espinhos de nada para defendê-la do mundo..."
O Pequeno Príncipe, Antoine de Saint-Exepéry

Caminhava eu pelo deserto
Ia buscando o céu.
Nele uma estrela solitária me olhava.
Seu olhar triste penetrava todos os meus poros.
Meu olhar triste, disfarçava a dor sentida
O sorriso que o rosto forçava.
Da estrela do deserto em que estava
Percebi que o princepezinho
Ainda era, embora seis ou sete anos mais velho,
Belo, sensível e doce como aquela água límpida do poço.
Fugi do deserto em uma "besta" qualquer.
Da vidraça, o olhar triste do princepezinho
(Agora disfarçado de índia uniformizada)
fazia-me orvalhar.


Hoje carrego comigo não só meu corpo.
Trago também o deserto
E nele a imagem do princepezinho que chora
E que, disfarçada de índia, também força o sorriso.
Os sorrisos nada mudam das saudades que sentimos.
E os carneiros podem estar soltos
Corre risco a flor única.

 Rio, 03/03/2000 (JWCL)










6 comentários:

Edmilson Borret disse...

Jorginho,meu querido
Demais esse seu texto!!!! Veio-me num momento todo especial. O que me fez lembrar de uma postagem minha onde também disserto sobre a amizade. Segue um trecho dessa postagem e o link para a mesma:

Uma palavra que adoro é premente: o que não permite demora, o que é urgente. Premente rima com gente. Gente pra mim é premente... Adoro gente. Amizade pra mim é premente. Consideração pra mim é premente. Premente é o afeto, o companheirismo, a dedicação ao outro. Disse em outra postagem que escrevo para ser lido e para que meus amigos me amem ainda mais, citando García Marques. Quem escreve descreve-se, é bem verdade. Mas também descreve outros. Descreve os seus pares. Esse retorno ao mesmo tema é para dizer que os entes que fazem a minha escritura é que me dão a minha verdadeira dimensão. Aproveito para pedir desculpa por não estar escrevendo nada tão premente assim nessa postagem. Não que o tivesse feito antes. Mas neste momento menos ainda. Vim aqui hoje mesmo só para comentar sobre os entes queridos. E isso pra mim já é muito...

http://gauche-nunca.blogspot.com/2010/07/por-que-por-quem-escrevo-reload.html

Grande abraço do amigo Ed!

Jorge Willian da Costa Lino disse...

Nossa, é premente clicar no link para ler o texto todo. Se tu escreves para que o amem ainda mais, segues a a sabedoria da rapoza amiga do principezinho: cativas. O problema (doce problema) é que cativar é criar laços e estes amarram todos que participam da relação. Li no teu orkut e compreendi , na sexta-feira um pouco da tua dor e no meio do texto que escrevi me ocorreu a lembranças de várias pessoas amadas e amigas. Entre elas estava um tal de Edmilson...Como não dava para dedicar a tantas pessoas queridas, acabei não dedicando a ninguém (ou a todos). Um abração. Vou ler teu texto agora.

Giovana disse...

Meu amigo anjo, dessa vez vc arrebentou. Eu simplesmente amo esse livro. Mas a minha frase favorita dele é SO SE VÊ BEM COM O CORAÇÃO, O ESSENCIAL É INVISÍVEL AOS OLHOS.
Como eu te falei me faz bem passar por aqui.
Outra frase que muito me marcou foi

"A gente corre o risco de chorar um pouco quando se deixou cativar..."

Anônimo disse...

A cada leitura que nós fazemos do livro tiramos uma lição para nossa vida,recordamos que muitos valaores foram perdidos com o passar do tepom como é citado no comentario feito por Jorge Willian pois tudo hoje é premente.
Esquecemos dos amigos, das relaçoes pessoas,esquecemos muitas vezes de viver simplismente pelo fato de vivermos em um mundo PREMENTE.

Anônimo disse...

Duas estrelas
ao longe, olharam-se
tão parecidas...
aproximaram-se.
Mostraram suas cores,
suas faces,
encantaram-se.
Em cada uma...um sorriso
desabrochou como flor
na mais colorida e terna,
desabrochou em amor.

Tuas letras muito me tocaram...são íntimas, de sentimento verdadeiro, postado em versos entrelaçados numa ternura sem igual. Parabéns pela sensibilidade demonstrada!
JP

Unknown disse...

Faz tempo que li "O Pequeno Príncipe" e o reli também muitas vezes... mas, seu texto, amigo Jorge, me fez relembrar toda a história e me encantar outra vez mais. Como um livro pode ser tão belo? E como é bela a maneira como você o descreve!
Sim, podemos ser únicos quando somos amados e quando nos permitimos amar!
Uma rosa que se tornou única no mundo porque foi amada e isso a tornou especial.
Que possamos ser especiais em nossas relações no mundo tocando o coração das pessoas e ser afetadas por elas.
"Tu és eternamente responsável por aquilo que cativas".