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segunda-feira, 29 de outubro de 2012

FLORA E O CAMINHO DO PARAÍSO

Ventava tanto que parecia que a velha árvore largaria suas raízes e sairia voando pelos ares. É bem certo que ela tentou abandonar os vínculos com o solo a fim de se tornar pássaro. Mas a realidade fora mais forte e resolveu mantê-la ali, bem imóvel, estática, apesar dos sacolejos que o vento lhe dava.

Passado o momento e o vento com ele, ficou a velha árvore a pensar na prisão que era ficar presa à terra por causa das amarras que são as raízes. Sem elas, poderia andar como os homens, saltar feito sapos e até mesmo voar como os pássaros que nela pousam buscando descanso entre um voo e outro. Raízes são prisões, definiu ela. Devemos destruir as raízes, pensou, elas não nos deixa encontrar "O Caminho Para o Paraíso".

Passou dias pensando em realizar o desejo e o pensamento. Resolveu por em prática pois, conforme ouvira do Antonio, um filósofo que gostava de sentar debaixo de sua copa, pensar sem praticar é mero idealismo e devemos ir em busca da práxis para que a realidade seja transformada conscientemente. Ouvira também do poeta Agenor que constantemente sentava encostado em seu tronco para escrever que a realização de um desejo valia mais do que mil sonhos. Ele, pensou a velha árvore, estava se referindo ao beijo que dera naquela moça bonita que lhe prometera compartilhar a vida. Tudo bem que o desejo de Flora Tristan- assim chamava-se a velha árvore- não era de compartilhar sua vida com o abacateiro que ela tanto admirava, mas era um desejo legítimo como definira  Jacques Wilhelm, o jovem e inconformado psicanalista que gostava de estudar sentado em um de seus galhos, o mais baixo, pois tinha medo de cair.

Decidida, Flora usou seus galhos como se fossem diversas mãos e foi se arrancando do chão. Ia quebrando suas raízes uma por uma. Doía, é claro, mas ela tinha resolvido seguir o conselho de Antonio e, mesmo com dores e com seiva escorrendo de cada raiz arrancada, ela prosseguiu. Até a última raiz ela sentiu doer, mas foi perseverante como lhe pregara o Alquimista Benjor, um próspero vendedor.

Sem as velhas raízes, Flora resolveu voar. Não conseguiu. Sabia que não era pássaro, e tentou dar um salto bem alto. Também não conseguiu. Pensou que sapo também não era e resolveu caminhar. Sem raízes e sem pés tombou lentamente. Deitada no chão, mas sem raízes para absorver nada, foi se definhando, foi se desmilinguindo, se descolorindo, secando.

Recentemente um vento forte passou por aqui trazendo folhas secas dos galhos de Flora. São folhas secas , mas que voam. Nem sempre seguem a mesma direção, mas voam. As raízes, contou-me uma das folhas, ainda estão lá no velho solo. Contou-me uma outra folha, que são as raízes que ainda tragam do chão mais profundo o desejo de liberdade da velha Flora. E quando elas, as folhas secas, absorvem um pouco da seiva começam também a desejar e se lançam nos ventos que passam de vez em quando, como este que vem lá velho mundo.

 Rio, 29/10/2012  05h
Jorge Willian

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Sobre Flora:
http://www.nodo50.org/insurgentes/textos/mulher/13floratristan.htm
http://www.isabelvieira.com.br/internas/materias_textomateria.php?id_materia=14

                    

domingo, 14 de outubro de 2012

PERSPECTIVAS

Esta árvore esconde a entrada daquela igreja
Ou sera, para quem vem de lá, 
Lá de trás da igreja,
Que esta árvore é escondida por aquela?
Mas se assim o for,
Para quem vem de lá,
Esta árvore passa a ser aquela
E aquela Igreja passa a ser esta
E quem esconde é escondido
E o escondido passa a esconder.
Perspectivas.
Beautiful Pictures of ChurchesDizem que tudo depende delas.

Jorge Willian

Rio, 20 de junho de 2011 (7 h e 20 m)

sábado, 13 de outubro de 2012

TENHO, MAS NÃO POSSUO

Queria tanto tê-lo e o tenho
O tenho perto, próximo, junto
Mas não o possuo e nem quero
Tenho o teu sorriso, teu jeito
Teu carinho, teu sorriso
Tenho tudo em mim
E tudo perto, próximo, junto
Mas não o possuo e nem me tenho.
O tenho na memória pequenino
E no olhar crescido.
O tenho dentro aqui
mas não o possou  que só és teu.

Jorge Willian

Rio, 13 de outubro de 2002 (1h e 30 min)