Amigos e/ou Leitores

quinta-feira, 22 de maio de 2014

ESTRANGEIRO E AUTOPSICOGRAFIA

Solidão é caminhar por entre as gentes
e não encontrar
um rosto estranho se quer
a melancolia que a alma sente
é o presente que agora ganho

Há quem fale de ideias fora do lugar
e realmente há
mas tenho um corpo adulto
que aqui não deveria estar
uma vida fora do lugar
um insulto.

Caminhando por entre essas pessoas
caminho triste, estrangeiro que sou
poeta,  não como Pessoa
me é impossível imprimir
a solidão que aqui pousou

E posso afirmar que não sou fingidor
não finjo nem exagero a dor que agora sinto
melancolia e solidão, não minto
é tudo humanamente real
embora sendo personagem de um ator

Rio, 25 de Maio de 1998
.............................................................................

(FERNANDO PESSOA)
O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.
E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,

Mas só a que eles não têm.
E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração.
27/11/1930
Imagem: http://www.google.com.br/imgres?imgrefurl=http%3A%2F%2Flounge.obviousmag.org%2Frisco%2F2012%2F06%2Ffernando-pessoa-um-bobo-apaixonado.html&tbnid=7r_JE9qfgcR99M:&docid=bYc0Mg-e4-K0yM&h=287&w=206

PÉGASO

I
Poesia?
queres sentir a poesia?
o teu querer é mais que metafísica
é delírio crédulo
de cavalo unicorne voador.

Olhe o concreto da parede que te abriga
do prato e da comida que te alimenta
do agasalho e do sapato que te aquecem
esquece agora esse delírio que chamam poesia.

II
Poesia
Há nos lagos, mares , céu
também na armação de tijolos
escondida pelo reboco e sua pintura.

Poesia há também na transformação
da areia em vidro
do vidro em prato
e em tudo que nele se põe
e nos dentes, na língua e saliva
e nas mãos que plantaram

Há poesia nos olhos
tristes dos agonizantes
ou alegres dos que, felizes, cantam
a correspondência do amor
Há poesia onde olho.

III
Todas  as coisas
do poeta
são poesias

O poeta:
a medida de todas as coisas

E a coisa poesia
é a coisa desmedida
do poeta.

E é desmedida a coisa
desse poeta?
E havendo a medida
a métrica
na poesia?

IV
Apostemos nesta métrica
a da poesia desmedida
assim como
o desejo de devorar
de comer
de deglutir
de mastigar
de engolir
de saciar
não meramente a fome
de imagens etílicas
e sim de paixão
pelos dedos e estômagos
de quem faz o pão
os tetos
as ruas
os papéis
os poetas
concreto
que sem pégasos
nos permitem.

Jorge Willian

Angra dos reis, 25 de maio de 1998 (23 h e 45 m)


imagem: http://www.wirelady.com/berrienwireunicornpage.html




quinta-feira, 8 de maio de 2014

CONCRETO/ABSTRATO



O homem pode ser livre
A liberdade, querida
Concreto, ele, sim, existe
Se esta é por ele perseguida.

Dois substantivos relacionados
O concreto na busca do abstrato
Dois entes apaixonados
Um apenas no retrato.

Outro na moldura
Permitindo a concretude
Do concreto envolvido.

O abstrato perdura
Em outro homem de atitude
Livre (se) construindo e construído


Jorge Willian
Rio, 08 de Maio de 2014 (11 h e 32 m).

segunda-feira, 5 de maio de 2014

EM GREVE

estradas me esperam
o céu azul também
todos pretendem a caminhada
ficarei, contudo, aqui
com tudo e com todos
que recusam, que não aceitam
que afirmam a negativa
que param
que não seguem
o caminho natural
as ordens deste céu azul
todos estes
que recusam a ordem
que afirmam
que anseiam 
a mudança
o mundo 
o novo
o novo mundo.

Jorge Willian
Rio, 05 de maio de 2014

(ao aniversariante e seus 196 anos)

domingo, 4 de maio de 2014

O RITUAL

Ele disse assim naquela noite: "façam isto em meu nome e no dele". Em seguida, subtraiu de cada um que observava tudo o que pode. Retirou-lhes a saúde, o tempo, o pão, a poesia, a alegria, a reflexão, a casa... tudo, tudo o que pode. E tudo foi entregue ao deus  no ritual dos cifrões. E, como o fogo que a tudo consome e de tudo se  alimenta, O deus agigantou-se, expandiu e foi tragando, incorporando tudo que estava a sua volta.

Ainda hoje, muitos banqueiros, industriais, fazendeiros mantem o ritual de retirar tudo que podem dos que criam os pães, as casas, as fábricas...  tudo. Ainda hoje, eles entregam ao fogo do deus capital o sangue, a carne, a juventude , a vida dos trabalhadores.

Ainda hoje, eles e seu deus contam com ajuda de diversos servos e servas. A ignorância talvez seja a mais fiel, pois não permite que se pense contra o deus capital. Ou talvez seja as forças policiais, estas que impedem as revoltas e jogam os infiéis mais rapidamente no fogo consumidor do ritual. Ou quem sabe, o mais fiel mesmo seja o sacerdote, este que usa diversas máscaras, como as de pastores, mestre-escola, filósofos, economistas, artistas, jornalistas... estas máscaras que pregam o amor  e a subordinação ao deus capital.

"Ajoelhados, repitam- diz o sacerdote- O Patrão nosso de cada dia, Amém. O capital de ontem, hoje e amanhã, hosana!"

 Enquanto isto, almas ainda  queimam no fogo que se alimenta.

Rio, 04 de maio de 2014
03 horas e 04 min.

ANTÍTESES

Das cores, o opaco
Dos átomos, os que ventam
Dos sabores, a água
Dos nomos, o desvio

Dos seres, o naturante
Dos dias, o zero
Dos quereres, a ausência
Das poesias, as imagens

Dos naturados, a luz
Das estrelas, os espaços
Dos namorados, a vontade
Das querelas, o silêncio

Jorge Willian

Rio,04 de Maio de 2014
02 h e 28m

DIMENSÕES

Se espaço, ausência
Se tempo, vazio
Se elemento, o nada
Se ideia, então tudo.

Jorge Willian

Rio, 04 de maio de 2014
2 h e 8 min